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Ganhei de presente de uma amiga (obrigado, Carol!) o ótimo “
Uma História do Mundo em Seis Copos”. Escrito pelo jornalista Tom Standage, editor de negócios da Economist, é uma mistura esperta de gastronomia, economia e política. Standage associa cada tipo de bebida a uma sociedade e/ou época: cerveja (Mesopotâmia), vinho (Grécia e Roma Antigas), destilados (colônias européias na América do Norte e Caribe), café (Iluminismo europeu), chá (expansão do império britânico no século XIX) e coca-cola (EUA no século XX). Ele argumenta que, para além de suprirem necessidades físicas, essas bebidas atendem a outras demandas: sociabilidade, estímulos, sinais de sofisticação e riqueza e até proteções à saúde pública.
Afinal, lembra Standage, durante boa parte da história foi difícil manter a água limpa e isenta de contaminação – e, na realidade, o problema ainda é sério, persiste em muitos países em desenvolvimento. Nessas circunstâncias, bebidas fermentadas ou destiladas ajudavam a combater doenças, por agir contra os germes na água.
A humanidade aprendeu a fabricar bebidas alcoólicas muito cedo, ainda na pré-história. Segundo Standage, a prática começou quase junto ao cultivo de cereais, com a cerveja feita a partir do trigo, nas planícies da Mesopotâmia, entre os rios Tigre e Eufrates.
O vinho também teve início na Antiguidade, mas a princípio era um tanto caro, reservado para as elites por conta do preço. Na Grécia, a bebida se tornou o centro de um ritual festivo, o
simpósio, no qual amigos se reuniam para beber e debater temas filosóficos. O mais famoso, claro, é aquele retratado no “Banquete”, de Platão, em que Sócrates discute o amor. Cultivar vinhas era símbolo de prestígio e uma maneira importante de mensurar a riqueza. O status social elevado associado ao vinho permanece até hoje, com um verniz de sofisticação que falta, digamos, à cerveja.
Os destilados surgiram no Renascimento, por conta dos avanços na química – ainda que misturados ao misticismo da alquimia e à busca de uma “água da vida” de propriedades mágicas e curativas. Tiveram papel de destaque na colonização das Américas, sobretudo o rum, feito a partir do melaço da cana-de-açúcar. Era um item importante no comércio exterior colonial, e fundamental para manter as pessoas aquecidas nos invernos do Norte. Standage menciona apenas o universo anglo-saxão, mas a cachaça teve uma importância semelhante no Brasil, durante o mesmo período, em especial como moeda de troca no tráfico de escravos com a África.
Se o rum traz a marca da associação com a escravidão, o café é o símbolo da liberdade intelectual do Iluminismo e da Era das Revoluções. Bebida estimulante que não provoca a intoxicação, ideal para alimentar trocas de idéias e discussões políticas – e os cafés de Londres e Paris foram centros desse tipo de atividade. Como lembra Standage, a queda da Bastilha nasceu de um comício num desses estabelecimentos.
O chá tem uma história igualmente vinculada a acontecimentos políticos. Nos séculos XVIII e XIX era o principal produto que o Ocidente importava da China. Com o tempo os britânicos descobriram que o ópio era uma boa maneira de pagar pela mercadoria, mas como o governo chinês não gostou da idéia de comprar grandes quantidades de drogas pesadas, teve que ser forçado a fazê-lo, por meio de guerras. Mas logos os britânicos aprenderam a cultivar o chá na Índia, que haviam recém-incorporado a seu império. E, naturalmente, os impostos sobre o chá foram importantes para deflagrar a Revolução Americana. Bebida complicada.
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Por fim, Standage analisa a Coca Cola como símbolo do “Século Americano”, e da difusão do American Way of Life pelo mundo, no rastro dos soldados que lutaram as guerras da nova superpotência, e impulsionada pelas modernas técnicas de publicidade e comercialização.